D708 Faça valer
É amigos, está chegando o fim! Terça estarei em SP para começar um novo ciclo de Vidaza. Faltam 3 contando com esse. Sobre a Leucemia não muito o que comentar.
Em relação aos fêmures, brinco que uso a muleta para pegar a preferencial. Realmente não dói como antes, mas dói. Ainda manco discretamente. O pilates está ajudando a fortalecer e acho que já evoluí muito bem para quem ficou numa cadeira de rodas. Resolvi pegar o adesivo para deficiente, pois por mais que eu brinque não está fácil caminhar tanto assim e quanto mais eu poupar o fêmur mais ele vai durar.
Está tudo indo bem demais. É aquela história… “está ruim, mas está bom”. A retirada total dos imunossupressores está sendo mais tranquila do que eu esperava. Para quem não lembra o imunossupressor é o remédio para evitar a rejeição do transplante. E digamos, é o inverso de um transplante de rim, por exemplo. Nesse caso o risco do receptor rejeitar o rim existe por ser um corpo estranho para as células de defesa. No meu caso e em um futuro próximo de mais um amigo meu é a medula que produz nossas células de defesa. E como a medula veio de outra pessoa (no meu caso não era 100% compatível ((50%))), a chance dela (produtora das defesas) rejeitar a gente é grande. Como muitos de vocês presenciaram minha pele de jacaré e as cicatrizes que ficaram. E a rejeição pode acontecer em qualquer parte do corpo já que o corpo inteiro é estranho para a nova medula.
Por conta dos imunossupressores a medula estava “calminha”. E fui tirando aos poucos para ver como ficaria. Já estou há alguns dias sem, não sei dizer se é pouco para ver um resultado concreto. Confesso que perdi umas noites e uns momentos de paz com isso. Imaginando como seria. Se com imunossupressor eu tinha rejeição, ficava imaginando como seria sem. Se iria precisar pelo resto da vida. E isso seria um limitador em muita coisa, já que minha imunidade continuaria baixa por conta deles. Pois assim como o remédio acalma para não rejeitar meu corpo, a defesa também fica “calma” para as doenças que aparecerem. Mas essa preocupação a cada dia que passa está ficando para trás!
Essa segunda chance da vida me faz pensar todo dia enquanto tomo meu café sozinho. Um dia aprendi que meu corpo é meu templo. E por mais que eu não seja de rezar sempre paro para apreciar e agradecer essa nova chance. A importância de cada palavra de motivação que recebi e até hoje recebo. Agradeço por ter pessoas essas pessoas sempre me incentivando e orientando. Sempre é bom receber uma palavra de conforto quando não estamos bem. E hoje em dia tenho tentado dar um pouco desse apoio pois sei o quanto tão pouco é tão importante.
Muitos de nós (ex doentes, ex acidentados, ex assaltados, ex naufragados, etc) sabemos o que significa uma segunda chance. Aquele momento que a vida recomeça. Passamos a ter esse sentimento que temos que viver e fazer valer a pena essa nova vida. Repensamos e encontramos novos valores para viver. Passamos a aproveitar cada nova oportunidade.
Essa nova vida vem repleta de novas possibilidades. Nossas preocupações parecem ser menores do que eram e apenas vamos vivendo e desfrutando dos momentos. Cada dia é motivo para celebrar. Passamos a nos sentir abençoados por termos problemas. Sei que parece estranho e sei que reclamo das dores. Mas sei que quando as sinto lembro que só tem problema quem está vivo. E não serão as dores que irão tirar minha alegria que transborda por estar vivo. Cada dia passou a ser um Bom dia. Vivemos em abundância e os momentos de felicidade não ficam mais confinados. Passamos a espalhar essa felicidade por ai. A cada “bom dia” com um sorriso no rosto vamos espalhando a alegria de viver (de reviver).
Sei que a doença teve um papel fundamental nessa nova perspectiva de vida. A segunda chance nos torna mais passivos. Passamos a aceitar melhor a dor, a tristeza e as dificuldades. Nos conformamos com o que nos é oferecido naquele momento, mas não significa que desistimos. Mas ao passar por situações como essas vimos que não existem limitações para sermos felizes. Se fui feliz com câncer por que não seria feliz com o Vasco na segunda divisão? A aceitação e saber aceitar foi o que mudou completamente o significado das coisas. Vivenciamos certas situações que nos fizeram (ou fazem) sermos mais ousados. Desfazemos de nossos medos e inseguranças e escolhemos viver. “Eu prefiro ser… essa metamorfose ambulante…” Passamos a entender, com a segunda chance, que um momento chega e a gente passa a enxergar o que nunca percebemos em toda nossa vida.
Compreender que a vida quase nunca é tão séria quanto fazemos dela foi a maior lição. E quando aprendemos a reconhecer isso parece que a vida nos proporciona cada vez mais chances de brincar com ela. Afinal, quem não se lembra do indiano loiro aqui. No início foi aquele choque. Mas como adoro frases prontas… “Ria para não chorar”. É difícil aceitar essas surpresas da vida, mas quando aceitamos… Estamos preparados para receber o novo, pois sabemos que logo ali no fim do túnel tem algo maravilhoso. Toda a pressão, todo o medo – tudo desaparece quando aceitamos as coisas como nos são oferecidas e passamos a ser mais leves (mesmo com duas muletas).
O mundo é sério demais já para nossas segundas chances também serem. Por mais alegres “bons dias” (está certo isso?) e por menos preocupações. Floreça! “Use seu sorriso para mudar o mundo, não deixe que o mundo mude seu sorriso”
(Ficou grande, eu sei)
Doe Medula! doe Sangue!