D249 =)
D249
Estava lembrando de uma conversa que tive com uma amiga, que teve leucemia algumas vezes também, em que ela reclamava de tantos problemas que ela tinha. Eu ainda estava na minha segunda leucemia, mas já entendia bem o que ela falava. São tantas pedras, o tempo todo surge alguma coisa nova e diferente que assusta a gente durante o tratamento/acompanhamento, que podia passar a noite contando como se fossem estrelas…
Às vezes é difícil se manter disposto a tirar todas do caminho. Escuto com frequência que “não posso me queixar de problemas perto de você, ou do que você já passou”, mas somos todos um pouco perfeccionistas, então nunca estaremos satisfeitos, seja qual for o tamanho do nosso problema. Sempre teremos algo nos incomodando. Acho que talvez esse seja um dos meus maiores defeitos, um que quem me conhece aponta constantemente, o fato de querer tudo do meu jeito. Mas tem algumas coisas que fogem do nosso controle e não me acostumo com a ideia de não ser da forma que eu quero que aconteça. Afinal, sou o “dono da verdade”, como dizem por ai. A gente vai estabelecendo metas. Tentando traçar nosso destino e pensar lá na frente, achando que tudo esta na nossa conta, na nossa responsabilidade. Só que não é bem assim, às vezes algumas coisas têm que sair do eixo para a gente entender que não temos o controle de tudo, nem somos os donos da verdade. Se você quiser, pode chamar isso de Deus, também. Só que é difícil apenas deixar as coisas fluírem naturalmente. Fica mais difícil ainda quando ficamos encarregados de deixar as coisas simplesmente acontecerem. O problema é: já é normal sentirmos tensão, ansiedade, angústia, entre outras dessas coisas que nos afligem, quando o normal seria não carregar tanto peso nas costas.
É complicado buscar forças quando esses planos não dão certo ou alguma coisa foge da nossa expectativa. Sempre fui bem centrado em relação à doença e tratamento, ou se preferir, sempre tive meus pés no chão. Sempre tive noção do que estava passando mais do que ninguém. Alguns me diziam que eu não devia ser tão realista, achavam até que eu era pessimista. Existe uma diferença entre ser pessimista e realista. Lembro bem, como se fosse ontem, quando meu irmão fez pela primeira vez o teste de compatibilidade, no qual ele era a pessoa com maior chance de ser compatível (1/4 ou 25%). Todos criaram uma expectativa absurda em cima daquilo, acredito que ele também. Mas naquela situação preferi pensar que o que tivesse que ser, aconteceria. Óbvio que queria muito que ele fosse compatível, mas não ganho nem em Cara ou Coroa, que é 50%. Então não foi uma questão de negatividade ou de falta de fé, mas de realidade dos fatos. Se ele fosse compatível a alegria seria enorme, é claro! Mas meus pés no chão não deixaram a ansiedade tomar conta, nem me abater. Só que ainda não sei viver deixando as coisas rolarem assim dessa forma. Tem horas que preciso ficar quieto para conseguir entender essas coisas acontecendo, já desisti de buscar o porque de tantas pedras. A única saída é realmente colocar os pés no chão e deixar a cabeça de lado, mas ficar no meio da razão e da emoção ainda é um desafio. Somente eu posso alimentar minhas expectativas e me iludir em relação ao que está acontecendo ou o que pode acontecer. Hoje em dia, sei que somente eu posso criar isso, me enganar com minha verdade. E nessa hora que preciso dos pés no chão, senão vai chegar uma hora que criarei um hábito de me iludir e criar expectativas desnecessárias, ansiedades e frustrações desnecessárias.
Até hoje a melhor saída para tratar disso tudo foi encarar de uma forma simples. Nunca deixei de fazer as coisas que me dão prazer e que para mim são “sagradas”, as quais não preciso esperar nada em troca, não preciso criar expectativas. E quando consigo ficar assim, costumo ter resultados melhores do que quando fico alimentando a mente com ideias, problemas e soluções. Às vezes, não pretender chegar a lugar algum é interessante (é claro que não estou dizendo que tenho que ser vagabundo). Lembrando do post antigo das frases prontas, “relaxa e goza” resume bem o que estou tentando dizer. Não há necessidade de ficar esperando que as pedras saiam do caminho, elas vão sair. Sempre saem. E quanto ao fato de não perder tempo com os problemas que irão se resolver, podemos apreciar momentos que talvez sejam únicos ou tornar momentos como sentar no parque e ver as tiazinhas praticando tai chi, crianças brincando, se tornem extraordinários.
Durante meu tratamento não precisei ter pressa para nada. Muitos dos problemas que surgiram eu nem vi, graças aos meus pais. Talvez eu nunca saiba como expressar essa gratidão. Mas esse suporte me permitiu sempre poder me achar nas crises. Lembrar que sou capaz de deixar de lado qualquer expectativa gerada ou qualquer ilusão ou desilusão que eu esteja criando.
Andar despreocupado sempre me ajudou a tirar as pedras do caminho. A caminhada é cansativa, mas “continue a nadar”…
Sem muitas novidades sobre o tratamento, apenas deu vontade de escrever!