D1573 Família é quem vc escolhe pra vc
Como mudar os hábitos? É difícil mudar quando estamos tão habituados a certas coisas. As vezes o hábito em alguma coisa está tão dentro de nós que temos certeza de que iremos viver aquilo no dia, assim como iremos ver o nascer do sol, respirar, abrir os olhos ao acordar. Nem lembramos de que irá acontecer, pois é tão natural que já está no subconsciente.
Mudar por vontade própria algum hábito talvez seja mais difícil, considero até uma vitória pessoal em diversas ocasiões. Só que as vezes os hábitos são mudados da noite para o dia, como se o sol não tivesse nascido e os olhos permanecessem fechados ao acordar.
Em 2011, comecei a embarcar com o Leo e a Lu. Lu era uma irmã mais velha, Leo era um irmão mais novo. Lu dando bronca para estudarmos e Leo levando surra no Fifa como de costume. Lá aprendi muita coisa para a vida, tínhamos uma relação intensa a bordo e em terra. Embarcado foi onde criei a paixão pelos pores-do-sol e muitos foram divididos com eles. Um ano e meio, quase dois anos depois veio o diagnóstico.
A história do diagnóstico é um tanto quanto incomum. Leo, lu e meus pais souberam pelo pai da Lu da minha leucemia antes de mim. Só descobri isso quase 6 meses depois. No início do meu tratamento eles ficaram ali presentes por muito tempo e a vida aos poucos levou cada um para um novo rumo. Lu para a Europa e Leo para a Austrália, só que o Playstation ficou comigo.
Lu seguiu uma linda vida, casou com Benzinho. Leo voltou da Austrália e continuou com os embarques. Ver o sucesso e realização que eles tiveram nesses anos de tratamento sempre me animaram. Talvez por isso minha meta de embarcar nunca tenha saído da minha cabeça. Seria bom ter essa tripulação de novo, com tantas histórias para contar que vocês cansariam de escutar.
Um ano depois Leo veio morar comigo em Arraial. Ainda estava me recuperando do tratamento. E tive a chance de ter aquele irmão que a vida havia me presentado comigo novamente.
Colecionamos diversas histórias novamente, e a maioria com o mar envolvido. Talvez a mais marcante tenha sido o primeiro dia em pé na prancha depois de alguns anos. Mantive meu papel de irmão do meio cobrando a louça suja para lavar e talvez esse seja o mais marcante para ele. Teve também minha primeira subida de escada e alguns duelos no Fifa.
Esse mês foi a vez do Leo defender o mestrado. E é claro que como todo aluno do Edu teve uma das melhores defesas. Só que com a defesa do Leo veio também a hora de dizer adeus, afinal “o pra sempre, sempre acaba”.
Do meu ponto de vista, o Leo sempre foi uma pessoa que não se contentava com pouco. Cheio de energia, nunca parava quieto em um lugar. Nos desembarques sempre arrumava umas viagens loucas escutando Justin bieber para ajudar com os bullyings da gente. E não era de esperar outra coisa quando terminasse o mestrado.
Momentos como “vai querer ovo?”, “leva o lixo”, “compra tapioca”, “tem onda amanhã?” não terei mais. Foram parte de um capítulo enorme na minha vida e sempre serei grato por isso, mas esse hábito irá mudar…
Uma vez li que “os que se contentam com pouco permanecem pequenos: pequenas as alegrias, pequenos os êxtases, pequeno o ser” e Leo sempre foi o oposto. Já estou curioso para saber qual será o novo passo. Aproveite a nova jornada! E estaremos por aqui celebrando cada novo passo, cada novo voo.
Aprendi muito com os dois. Somos bem diferentes, funciono fazendo um pouquinho de cada coisa. Leo quando decide fazer algo mergulha de cabeça, seja nas viagens, nos estudos para investir, nos embarques, no namoro. Até a defesa do mestrado que estava atrasada, quando chegou a hora ele sentou e se dedicou até ficar pronta.
Obrigado a vida e ao Leo por poder viver mais um pouco daquela nossa vida embarcada em terra. Entender que em cada passo que damos, devemos dar presentes por inteiro. Cada passo com total atenção dedicada a eles. Na teoria já aprendi, agora falta a pratica! E cada vez que um passo for dado com total atenção e dedicação terá um pouco desse capítulo que vivemos.
Talvez um dia nos encontraremos novamente, o que tiver que ser será. Sinto por não saber expressar essa partida, mas tenho em você um grande irmão mais novo mesmo que por uns dias de diferença. Foram a família que escolhi para viver antes de câncer. E que você tenha aprendido comigo a não deixar a louça acumular!