D157
D157 e tudo em ordem. Esperando…
Nesses dias que passaram a palavra desapego apareceu muito. Lembro de gente chorando porque queria desapegar do cabelo e hoje está super bem com o cabelo como ficou. Como já perdi os cabelos 3x por causa de quimio e umas 200 por raspar o cabelo para não ter que lavar, não posso dizer que era apegado ao meu. Não só apego em cabelo, mas a vaidade de uma forma em geral.
Também revi minhas fotos de indiano algumas vezes essa semana, mas na época aquilo realmente me incomodava. Era apegado a minha aparência. Vi o quanto aquilo me incomodava toda a vez que olhava no espelho. Fazer o primeiro xixi no cálice para calcular o balanço hídrico do dia e olhar aquele indivíduo no espelho que com certeza não era eu. Indiano, careca, com um lábio rosa de constrate com aquele tom. É realmente horrível não se sentir bem com a aparência. Uma comparação tosca, mas acho que devia ser algo semelhante a uma pessoa com distúrbio alimentar se olhando e se sentindo gorda ou magra demais.
Comigo foi tranquilo perder os cabelos, pelos das axilas (vulgo sovaco) e por ai vai. Mas tocou na ferida quando a sobrancelha ameaçou a cair, não queria parecer o tio chico da fámilia adams. E eu que achava raspar cabelo uma coisa besta entendi o problema que é para uma menina que trata o câncer. “Cada um sabe aonde o calo aperta”, né?
Mas praticar o desapego de uma forma assim forçada é interessante de se viver. Muda as perspectivas. Economizei shampoo que vocês não se acreditam. Conheci pessoas maravilhosas sem precisar ver eles “produzidos”. Conheci realmente as pessoas sem estereótipos (tirando o estereótipo do câncer). E a gente vai deixando a vaidade de lado… Pessoas que não se preocupam com o que você usa ou o quanto você é belo fisicamente. Aprendemos ali na música da reunião de toda segunda que além de um belo visual tínhamos mais a acrescentar, a dividir e a somar.
Quanto a minha cor, fui acostumando apesar de todos que sabiam que aquilo me incomodava falarem que eu estava clareando. Sabia que não estava. Mas o que era um peido para quem já esteve cagado. Todo mundo falava que o efeito iria passar e que eu voltaria ao normal. Só que realmente não havia o que fazer, só esperar. Assim como com o cabelo que um dia volta a crescer (não para todos), tive que ter paciência e desapegar. Sempre fui daqueles que concordava com Vinícius de Morais em relação a beleza. Só que entendi que a beleza tem várias formas.
Ficava lá, olhando no espelho e lamentando pelo gandhi no reflexo. Aprendi a esperar. Todos esperamos pelos momentos certos. Até as árvores esperam pelo outono para ficarem carecas e mesmo assim ainda tem seu charme. E não as olhamos como se estivessem morrendo, mas na expectativa primavera. Esperei e meu outono passou. Cadê o verão? Só não vou dizer que estou pronto para desabrochar que vai ficar estranho.
Já tive algumas amigas que doaram… Não foi sangue, nem medula. Mas doaram um pouco da vaidade delas para fazer a alegria de crianças com câncer com seus cabelos. Um gesto de desapego para alguns e uma alegria sem fim para quem não consegue aceitar o tio chico. Pratique o desapego!
Doe-se…
Doe sangue
Fonte da imagem: internet
Belo texto!!!!