D1450 Aprecie com moderação

D1450 Aprecie com moderação

15 de fevereiro de 2019 0 Por Daniel Campbell

“Aprecie com moderação”. Se você já leu essa frase é porque usa algo que te faz mal e você tem conhecimento disso, certo? E como definir o limite da moderação? No meu caso NÃO estou me referindo a bebidas ou cigarros. Só que moderação no meu caso está relacionado a responsabilidade.

Esse é um dos meus maiores desafios atuais, apreciar a vida com moderação. Depois de passar por tudo isso, voltar a “viver” (aspas pois nunca deixei de viver, talvez tenha até vivido mais do que antes), a ter liberdade que o tratamento nos privou durante tanto tempo é difícil de administrar.

Fiquei pensando em algumas comparações de sentimento. Talvez a que se aproxime mais seja a sensação de uma criança deslumbrada entrando em um parque de diversões sem saber o que fazer, igual “pinto no lixo”. E é aí que mora o perigo, pois crianças não tem responsabilidades, pelo menos não aos olhos da lei.

Então entrei no parque de diversões da vida sem o câncer, não precisei de adulto responsável para me acompanhar. “Viver cada dia como se fosse o último”. Brincar no carrossel, bate-bate, montanha russa e todos os outros brinquedos antes que o dia acabe. Nos perdemos com tantas coisas fascinantes que esquecemos de beber água, passar protetor e olhar para o relógio. Se você não teve câncer talvez sinta, em intensidade diferente, algo semelhante de querer aproveitar os dias com 30 horas quando sai de férias.

É uma mistura de tirar o atraso do tempo perdido durante todo o tratamento com o fascínio de olhar o mundo com esses novos olhos que nos deixa tão deslumbrados. Antes da doença eu tinha um objetivo. Talvez muitos de vocês em momentos diferentes da vida devem ter passado por esse momento. Queria sucesso na vida profissional e estava bem encaminhado.

Embarcava 35 dias em navio e depois 35 dias em terra curtindo a vida. Aproveitava dessa rotina de trabalho que para alguns parece loucura. Só que tudo depende dos olhos que olhamos para as coisas. Diziam “35 dias, você é louco de ficar no mar tanto tempo”. Só que sempre preferi pensar que trabalhava apenas 6 meses do ano e que tinha 6 meses de férias parceladas.

Fora essa rotina atípica de trabalho, minhas metas podiam ser consideradas normais. Era crescer na carreira, quem sabe casar, 2 filhos para ensinar a surfar e jogar bola, 1 cachorro. Estava seguindo bem o plano até que surgiu o diagnóstico da leucemia.

Passei por todo o tratamento e fiquei lá, sentado na porta do parque de diversões esperando abrir novamente. Só que dessa vez preferi não perder muito tempo nas minhas ideias antigas, corri para a montanha russa, pois nunca sabemos quando ou se o parque irá fechar.

Depois de tudo isso a gente quer apenas se sentir vivo. Coisas que eram normais para um adulto passam a ser deixadas de lado. Começamos a buscar as coisas que antes não eram tão valorizadas como deveriam e que acabávamos deixando para amanhã pois tínhamos aquele plano de adulto para cumprir.

Um dia todos pensamos naquele dilema clichê, “viver para trabalhar ou trabalhar para viver?” Crescemos, e agora? Ficamos acorrentados no dilema de ter empregos e metas que as vezes são mais dos outros do que nossas. O brilho no olhar da criança foi embora e nos tornamos aqueles adultos chatos que só reclama.

Se você reclama, você clama 2x. As vezes reclamamos das nossas vidas, afinal somos humanos. Se você é religioso, lembre-se que Deus nos deu livre arbítrio. Não estou falando aqui para abandonar o emprego e correr para o parque de diversão. Mas se existe algo que não está bom na nossa vida, o que estamos fazendo para mudar?

Temos uma única chance de fazer o que nos traga paz, afinal a vida é uma só. Achar o equilíbrio e saboreie a vida com moderação. Sempre procure o equilíbrio. Refrigerante em excesso faz mal, contudo “água demais também mata a planta”. Viver no equilíbrio entre as responsabilidades e os prazeres da vida talvez seja o segredo para a vida feliz e plena.

                Engraçado escrever isso tudo e lembrar de como senti falta de trabalhar nos embarques durante o tratamento. Sentia falta de ser útil, de produzir. Li esses dias que “até um milionário não viverá muito tempo e se cansará logo da vida se permanecer em seu leito todo o dia, alimentando-se. O apetite vem do exercício”. Em alguns momentos no início do tratamento eu falava que estava embarcado ao invés de internado por força do habito. Lá talvez fosse meu parque aquático.

                “Quem dorme sonha, quem vive realiza”. Que parque de diversão seja a realidade sua vida (com ou sem aspas).