D1348 Resistir é preciso
Passando para dar notícias e escrever um pouco sobre esses dias. A rejeição de pele parece estar controlada, estou usando os remédios direitinho. Quase não estou me coçando, só que percebo a pele um pouco diferente, nada que não tenha jeito. Como diria meu avô, “o que não tem remédio, remediado está”. Já sei que é psicológico então não tem muito o que fazer, apenas sentar, esperar e não coçar.
Esses dias tenho conversado bastante com pacientes que estão passando por algo semelhante do que vivi. Um deles está tratando no hospital que tratei no Rio e a outra é uma amiga de 2 anos que descobriu um linfoma recentemente. É curioso notar como somos tão parecidos no início do tratamento. Somos muito diferentes, mas mesmo assim me fez lembrar bem do início do meu tratamento.
Algumas atitudes me fizeram lembrar até de uns posts antigos desse diário de bordo. Eu era muito fechado em relação ao que se passava na minha cabeça (acho que ainda sou um pouco). Mas no meu caso essa resistência para conversar e me abrir era tanto do orgulho quanto do medo.
Com o passar do tempo o choque de realidade vai deixando de ser choque e ficamos inseridos na nossa nova realidade de paciente. Uma realidade um tanto quanto dura, talvez por isso a resistência pareça, à primeira vista, a saída mais apropriada.
O medo do que poderia acontecer durante o tratamento, medo de não conseguir ser forte para quem estava ali do meu lado. Essa sobrecarga de emoções, de imaginar tudo que já vivemos até chegar ali no diagnóstico. A sobrecarga de ver os planos e o que projetamos para uma vida futura e sadia, afinal ninguém faz planos pensando em descobrir um câncer em idade alguma. Eu ainda era muito jovem nessa jornada inusitada, sem muita experiência para entender que, às vezes, viramos uma panela de pressão de sentimentos.
Não saber como me abrir era um tanto difícil para quem prefere chorar sem ninguém ver. Mas depois de ser promovido de junior pra sênior no tratamento da leucemia passamos a entender que não precisamos absorver todos os sentimentos.
E aqueles à nossa volta estão ali justamente levantando a válvula da nossa panela de pressão para não existirem preocupações além do tratamento. Assim, vamos desapegando aos poucos dos medos e incertezas. Então passamos a viver intensamente, sem tantos receios.
Temos tantas pessoas amadas e queridas que aos poucos vão minando nossa resistência e fazendo com que baixemos nossa guarda. O amor de tantos envolvidos vai diluindo nossa insegurança e nossos medos. Vamos nos cercando de pessoas que nos amam e vivem o nosso medo e então percebemos que estamos juntos nessa luta.
Achei curioso receber um cacto de lembrança do chá de lenço dessa minha amiga. Fiquei pensando no cacto por algum tempo ainda. E é bem assim no início, somos difíceis de sermos abraçados, levantamos nossas barreiras e espinhos com receio de machucarmos alguém. Só que como todo bom cacto, somos resistentes (no bom sentido da palavra) e entendemos que não precisamos de muito para viver, apenas algumas doses de amor.
Não vencemos o câncer sozinho. Somando nossas forças e sabendo ser amado não existe espaço para tristeza e solidão. Quando vocês nos regam (ou regaram) com um pouco de amor, voltamos a ter chão, a celebrar, a sorrir, a florir…
Doe sangue, doe medula, doe amor, doe-se